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Dia Nacional da Luta Antimanicomial - Ágora Antimanicomial e Antiproibicionista

18/05/2023 10:00

Equipe ABRASME

Notícias, Incidências,

Dia Nacional da Luta Antimanicomial - Ágora Antimanicomial e Antiproibicionista

Confira a Carta Ágora Antimanicomial e Antiproibicionista

Ágora Antimanicomial e Antiproibicionista

 

Nos anos recentes, as políticas nacionais de saúde mental e de álcool e outras drogas vem sofrendo inúmeras tentativas de descaracterização. Percebe-se que desde a publicação da Resolução 32 e Portaria 3.588, em dezembro de 2017, houve um esforço sistemático, encampado pelo Ministério da Saúde, em instituir uma ‘nova’ política de saúde mental, e também uma política de drogas, que descaracterizam os institutos legais e constitucionais que embasam o tema no Brasil.

Acrescentam-se a estas normativas a Lei 13.840, promulgada em 5 de junho de 2019 e a Nota Técnica 11/2019, expedida pelo então Coordenador-Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas em fevereiro de 2019, que sistematizou um amplo quadro de ações a serem tomadas no campo, que vão na mesma direção de retrocesso. Ainda, citamos a Resolução nº 1/2018 do CONAD e o decreto presidencial 9.671/19, que alterou a política de drogas e retrocedeu à uma lógica excludente do cuidado às pessoas que fazem uso problemático de substâncias a partir do favorecimento de instituições privadas fechadas em detrimento dos dispositivos de cuidado em liberdade já existentes no Sistema Único de Saúde.

Dessa forma, a chamada “Nova política de saúde mental, álcool e drogas” significou um retorno a uma política que teve consequências drásticas para milhares de pessoas com quadros de sofrimento psíquico graves e/ou uso problemático de drogas no passado recente do Brasil. A perspectiva de mercado e de higiene social que contextualizam as grandes instituições psiquiátricas desde sua constituição no país, em meados do século XIX, reafirmam o anacronismo de sua orientação que retoma estratégias reconhecidamente ineficazes através de nova nomenclatura e justificativa de evidências científicas pouco consistentes. Além disso, ao excluir a discussão com a sociedade violam-se os preceitos democráticos garantidos desde a promulgação da Constituição Cidadã de 1988, em que a participação social é um direito, sendo o Sistema Único de Saúde um de seus exemplos mais frutíferos.

Transcorridos aproximadamente 30 anos de implantação de uma Política Nacional de Saúde Mental, construída de forma coletiva e participativa, houve o retorno de uma política centrada nos saberes, poderes e práticas psiquiátricas, reafirmando-se o hospital psiquiátrico como o território principal de tratamento e valorizando as práticas ambulatoriais que reforçam os saberes dos especialistas. Tais normativas, entre outras, favoreceram o modo de atenção com características excludentes, com práticas médico-centradas, que fragilizam o cuidado integral, em rede e produzido com a participação de familiares e de pessoas com sofrimento mental.

Além disso, há retrocessos inquestionáveis na Política Nacional sobre Drogas no Brasil. Sintetizada pela Resolução 01/2018 do Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas (CONAD), há uma “guinada à abstinência”, que reconstrói o estigma de que todo e qualquer uso de substância psicoativa causa sofrimento psíquico e social e consequentemente precisa ser medicado e ter tratamento segregado nos hospitais psiquiátricos ou ambulatórios especializados. O proibicionismo, sustentado pela racista e genocida guerra às drogas (e aos pobres), foi fortalecido em contraposição à Política de Redução de Danos.

O recrudescimento das comunidades terapêuticas, em um movimento que coadunou, no Poder Executivo, uma nova política de saúde mental e uma nova política de drogas, denota o intuito nítido de descaracterizar os institutos legais e mesmo constitucionais que regem a gestão da saúde no país, que se firmam nos princípios da universalidade, integralidade e equidade.

Principalmente, feriu-se a Lei nº 10.216/2001 (Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira), marco da luta antimanicomial, que veio garantir a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, promovendo uma verdadeira mudança paradigmática ao incentivar a desinstitucionalização dessas pessoas, em detrimento de um modelo manicomial, antiquado, com fortes características asilares e segregantes.

A política do Estado Brasileiro no campo da saúde mental destaca-se como a única experiência de cuidado em liberdade num sistema público, universal e estruturado em serviços comunitários no mundo. O brasileiro pode orgulhar-se da grande expansão da rede de Centros de Atenção Psicossocial que ocorreu no país, ao longo especialmente dos governos de Lula e Dilma. Em 2002, o país tinha 424 Centros de Atenção Psicossocial, sendo que em 2016 já eram 2530 serviços em funcionamento. Esta construção foi acompanhada pelo fechamento de instituições asilares conhecidas pela violação de direitos humanos, num redirecionamento dos recursos que transformaram a Reforma Psiquiátrica numa experiência única.

Entretanto, o Estado brasileiro vinha paulatinamente aumentado as verbas de custeio aos hospitais psiquiátricos, e pior, possibilitado meios de financiamento que visavam beneficiar e ampliar a rede privada, em especial as comunidades terapêuticas, em detrimento dos serviços extra-hospitalares e de cunho comunitário e desinstitucionalizando. O aumento deliberado de custeio de hospitais psiquiátricos, e cortes do financiamento destinado aos serviços de base comunitária e extra-hospitalar obrigaram o gestor local a fechar leitos no modelo extra hospitalar, e manter o número de leitos em hospitais psiquiátricos.

Cabe ressaltar que, mesmo após vinte anos de publicação da Lei Paulo Delgado, ainda há no Brasil milhares de pessoas internadas injustificadamente, em função de uma morosidade que traduz tanto a forma como as práticas asilares estão profundamente arraigadas nas instituições, quanto na ausência de investimentos suficientes para alcançar o intuito visado pela norma, qual seja, o de substituir ao máximo os serviços asilares por serviços de base comunitária, o que se mostrou mais adequado para gerar bem-estar e saúde, ao permitir a reinserção e inclusão das pessoas. 

Ainda assim, a partir do advento do modelo psicossocial territorial, em 11 anos o Brasil reduziu em 38,7% os leitos de hospitais psiquiátricos, substituindo-os por modelos comunitários e territoriais, e pela criação de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Em 2005, eram 40.942 leitos psiquiátricos, e em dezembro de 2016 os registros do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) computavam apenas 25.097 leitos e uma redução do percentual de gastos com a rede hospitalar de 75,24% para 28,91%. Em paralelo, a quantidade de CAPS subiu de 424, em 2005, para 2.500, em 2019, e o percentual de gastos extra hospitalares aumentou de 24,76% para 71,09%, com investimento financeiro nos equipamentos substitutivos.

O descumprimento direto ao objetivo da Lei 10.216/2001, em garantir a assistência familiar e o convívio em comunidade dos usuários da Rede de Atenção Psicossocial, demonstra que as normativas publicadas com esse teor, principalmente entre os anos 2017 e 2022, não são apenas destituído de razoabilidade, mas eivadas de ilegalidade. Não é exagero comparar esta sistemática afronta aos direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais como verdadeira tática de ‘terra arrasada’. Contudo, não há inimigo a ser combatido, apenas cidadãos já em condição vulnerável. 

Isto, por sua vez, torna a nova política de saúde mental ainda mais perversa, pois retira direitos de cidadãos/as vulnerabilizados, desmontando os serviços de base comunitária e de cuidado em liberdade, para beneficiar os gestores de hospitais e de comunidades terapêuticas, contando com cada vez maior financiamento e menor controle e fiscalização. Esses grupos corporativos apostam nos lucros do sistema de cuidados segregatórios e com violação de direitos.

          Com intuito de promover um diálogo horizontalizado e a participação social entre entidades, coletivos, frentes em defesa da saúde mental, grupos e movimentos sociais foram promovidos encontros denominados Ágora Antimanicomial. Nestes encontros foram discutidos pontos para uma agenda da saúde mental e uma política sobre drogas que serão dispostos a seguir:

  • Uma política de saúde mental, álcool e outras drogas, fundada em Direitos Humanos e na Reforma Psiquiátrica de forma universal e com equidade a toda pessoa em sofrimento psíquico, incluindo todas as faixas etárias e contemplando diversidades sexual e de gênero;
  • Fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial, revisão com ajuste dos valores de repasse para os serviços (exceto para Comunidades Terapêuticas), bem como incentivo para implantação de CAPS III (adulto, infantil e AD), leito em hospital geral e Centros de Convivência;
  • Atenção integral a crianças e adolescente;
  • Levantamento epidemiológico nacional em relação aos registros de tentativas de suicídio para reforço de recursos nos municípios de maior incidência;
  • Incentivando aos projetos de arte e cultura da saúde mental;
  • Investimento em formação para práticas antimanicomiais, antirracistas, antiproibicionistas;
  • Estabelecer metas específicas para melhorar os indicadores da saúde mental da população negra;
  • Revogação das legislações que retrocedem a reforma psiquiátrica antimanicomial;
  • Retirada das Comunidades Terapêuticas da Rede de Atenção Psicossocial, bem como o não financiamento das Comunidades Terapêuticas com dinheiro público e auditoria dos contratos das comunidades terapêuticas atuantes;
  • Alternativas de enfrentamento às internações compulsória;
  • Fortalecimento das estratégias de economia solidária e de geração de trabalho e renda, bem como a regulamentação e estabelecimento do marco jurídico, contábil e legal da economia solidária no campo da saúde mental;
  • Política Nacional de Convivência e Economia Solidária (que já foi aprovada na Conferência Nacional Popular de Saúde Mental e na Conferência Municipal de Saúde Mental de São Paulo.) Para que mecanismos e serviços intersecretariais promovam espaços de convivência na diversidade a partir da arte, cultura; provoquem territórios acessíveis às pessoas em especial àquelas em vulnerabilidade e estigmatizadas;
  • Que os CECCOs (Centros de Convivência e Cooperativa) sejam considerados um estabelecimento de Saúde com CNES (cadastro nacional de estabelecimentos de saúde) para que receba financiamento, compreendendo que também compõem o tripé da Rede de Atenção Psicossocial;
  • Revisão e regulamentação do marco legal e jurídico das associações e cooperativas sociais;
  • Participação de movimentos sociais da saúde mental na elaboração de políticas públicas para a saúde mental;
  • Incentivo aos projetos de moradia primeiro e acesso a banheiros públicos;
  • O direito à segurança alimentar e nutricional com restaurantes populares e cozinhas comunitárias;
  • Retomada do Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares (PNASH) e mecanismos de fiscalização e combate à tortura;
  • Incentivo aos cuidados em saúde mental na atenção primária;
  • Intervenções psicossociais para pessoas em situação de rua;
  • Continuidade do boletim eletrônico Saúde Mental em Debate;
  • Elaborar o Plano Nacional de Saúde Mental com a participação das entidades e dos movimentos sociais;
  • Incentivo/investimento nos processos de qualificação das/os trabalhadoras/es dos pontos de atenção da RAPS por meio da Supervisão Clínico-institucional;
  • Fortalecimento do controle social e da participação de usuários e suas famílias na definição, implantação, gestão e articulação da RAPS por meio de políticas públicas abrangentes, inclusivas e articuladas intersetorialmente;
  • Política de Cannabis Terapêutica no SUS;
  • Implantação da Farmácia Viva tipo 1, 2 e 3;
  • Desenvolver um programa nacional de protagonismo de usuárias/os e familiares, como trabalhadores de suporte de pares financiado por edital nacional;
  • Estimular a aproximação do movimento antimanicomial com o movimento das pessoas com deficiências, e incluir os direitos da Convenção sobre Direitos da Pessoa com Deficiência em nossa agenda da saúde mental;
  • Criar uma carreira nacional para os trabalhadores do SUS, estipulando salários de base, carreira de cargos e salários, preferencialmente como servidores públicos;
  • Investimento vultuoso na formação de equipes multiprofissionais de Saúde Mental com formação de quadros públicos;
  • Despatologizar e desmedicalizar as desigualdades, as LGBTQI+fobias, o racismo, as xenofobias... o uso de substâncias, a violência de Estado, assumindo a determinação social do sofrimento psíquico como orientadora das proposições das políticas ministeriais. Para tanto organizar a política de saúde mental sob cinco eixos: assistencial, legislativo, cultural, de formação e participação popular;
  • Destinar recursos públicos (Tripartite) para investimento e custeio da RAPS (nos serviços de base territorial e do cuidado em liberdade) e não financiamento de CT;
  • Formação nacional dos agentes comunitários de saúde em agentes redutores de danos (todo agente comunitário também deve ser redutor de danos);
  • Ampliação das unidades de Acolhimento Adulto e infantil nos municípios com incentivo financeiro;
  • Obrigatoriedade de formação de todos os profissionais de saúde no manejo aos casos AD (hospitais, unidades básicas, UPAs, SAMU);
  • Combater o punitivismo e o encarceramento em massa;
  • Retomada da lógica da Redução de Danos como princípio básico para formulação da política;
  • Atenção às violências institucionais contra mulheres que sofrem violências sexuais;
  • Desenvolver estratégias para centros de acolhimento e centro pop humanizadas e antimanicomiais;
  • Reavaliação, com a participação da sociedade, da atual política de drogas brasileira (proibicionista e repressiva), buscando, pelo debate aberto e amplo, um modelo inclusivo, justo, adequado às singularidades das populações, com respeito aos Direitos Humanos, com respeito à ciência e ao cuidado em liberdade em contraposição ao modelo repressivo e manicomial;
  • Descriminalização do uso de Cannabis e outras drogas, bem como o apoio aos médicos prescritores e acesso à Cannabis Medicinal;
  • Antiproibicionismo e apoio à agricultura familiar nas disputas envolvendo a legalização da maconha;
  • Apoiar e elaborar proposições antiproibicionistas para o campo de uso abusivo de substâncias e incentivar a pesquisa e utilização do Canabidiol como recurso terapêutico;
  • Extinção do departamento de comunidades terapêuticas;
  • Projetos Cuida do Cuidador;
  • Redução de danos assumindo protagonismo na política nacional de saúde mental;
  • CAPS AD suficientes para até 70 mil habitantes;
  • Profissionais de Saúde Mental em todas as UBS: psicólogo e terapeuta ocupacional;

 

Assinam este documento:

Associação Brasileira de Saúde Mental - Abrasme

Conselho Federal de Psicologia - CFP

Associação Vida em Ação

DESPATOLOGIZA - Movimento pela Despatologização da Vida 

Departamento Nacional de Enfermagem em Saúde Mental - ABEn

Frente Ampliada em Defesa da Saúde Mental, Reforma Psiquiátrica e Luta Antimanicomial - FASM Nacional

Movimento Nacional da Luta Antimanicomial - MNLA

Movimento Nacional de População em Situação de Rua - MNPR/SC

Frente Ampliada em Defesa da Saúde Mental e Luta Antimanicomial do Amazonas - FASMA

Frente Nacional de Negras e Negros da Saúde Mental - FENNASM

Grupo de Estudos em Álcool e outras Drogas - EE/USP

Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Políticas Públicas de Saúde Mental - GPIPPSAM

Articulação Nacional de Marchas da Maconha 

Núcleo Interdisciplinar de Estudos Epidemiológicos em Saúde Mental Álcool e outras Drogas 

Pretas Ruas

Monula oficial

Colegiado de Apoiadores da Rede de Atenção Psicossocial de Santa Catarina

Frente Ampliada em Defesa da Saúde Mental, da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial

Prevenção para Todxs 

Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis Sativa - SBEC

Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular em Saúde - ANEPS 

Coletivo Participa-Ação de Protagonismo de Pessoas Usuárias e Familiares-RJ

ABRAMD/Sul

ONG missão sem fronteiras Diversidade Social 

Conselho Regional de Psicologia CRP-01/DF

Centro de Convivência e Cooperativa Parque Previdência

Coletivo DasDoida 

Associação Construção

PUD - Psicanalistas Unidos pela Democracia

Coletivo Cidadãos Cantantes

Coletivo de Terapeutas Solidários de São Paulo

Coletivo Intercambiantes Brasil

 

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